Jade, a Pedra Sagrada, por Ricardo Joppert

Existem três minerais a que se chama de jade (Yu, em chinês): a nefrita, silicato de cálcio e magnésio, de estrutura fibrosa e lustre oleoso, quando polida; a jadeita, silicato de sódio e alumínio, de estrutura geralmente granular e lustre vitreo; a cloromelanita, pedra d'e um verde muito escuro, quase negro ("Jade Negro da Birmânia"). Em estado de absoluta pureza, tanto a jadeita quanto a nefrita deveriam ser brancas, sem qualquer traço de cor. Entretanto, na maioria das vezes, a mistura de outras bases na composição ocasiona coloração em ambas as substâncias. Na jadeita, a cor verde deve-se à presença de cromo; na nefrita, à existência de ferro. O cromo é o elemento colorante também da esmeralda e a melhor jadeita é sempre translúcida. A aparência oleosa, depois do polimento, é característica da nefrita. Como foi registra- do no capitulo II, o jade chinês dos primeiros tempos era a nefrita, importada da região dos montes Kunlun, ao sul de Khotan, na parte sudeste do Turquestão chinês, hoje Região Autônoma Uigur de Xinjiang. A jadeita provém essencialmente da região de Kachin, na alta Birmânia, mas as jazidas só foram descobertas no século 13 de nossa era e só em 1784 teve inicio uma importação regular do mineral pela China. O chamado "jade funerário" adquire, nas tumbas, em contato com os cadáveres, uma coloração amarronzada, que tem sido muito forjada pelos antiquários. Durante o período dos Zhou anteriores ou ocidentais, a escultura em jade seguiu os cânones dos Shang. Esses últimos empregavam, para esculpir, uma espécie de cinzel. Os Zhou, porém, desenvolveram a técnica pela criação de um instrumento composto de um fio de metal distendido que, usando areia como abrasivo, produzia estrias incisas no jade.
O jade dos Shang e dos primeiros Zhou servia a fins rituais e funerários. Por outro lado, vários tipos de objetos eram usados no desempenho de funções públicas. Assim, um rei, num momento de audiência pública, segurava um largo cetro retangular e perfurado na parte inferior chamado "zhengui"; um principe era reconhecido por um cetro alongado (xin); um duque, por um cetro estriado (huan); a pequena nobreza de viscondes e barões, por discos perfurados no centro, chamados "bi". As ordens reais, ao serem proclamadas, eram validadas por trazer o arauto uma espécie de cutelo longo (yazhang); um cetro dotado de um conto de lança (yangui) era a insígnia que protegia os embaixadores.
Acreditavam os antigos chineses que o jade, símbolo da pureza, tinha o poder de evitar a putrefação dos cadáveres. Muitas são as lendas a respeito da propriedade do jade de evitar a decomposição orgânica. Um certo Li Yu, por exemplo, teria encontrado em suas terras uma jazida de jade, com que se alimentou durante doze meses. Quando morreu, seu corpo não teria apodrecido. Consta que os Imperadores chineses ingeriam jade em pó, a fim de nutrir-se da "mais pura essência do Yang", no dizer do "Yijing" (Yi Ching). Os Zhou enterravam seus mortos em poços retangulares. A nobreza fazia construir câmaras mortuárias suntuosas, onde o corpo era colocado de costas para o chão. Cada orifício do cadáver era protegido por um objeto de jade. Um disco "bi", perfurado no centro, símbolo do Céu, era colocado sobre o peito. Sob o corpo do morto, ficava um "cong", peça retangular com uma cavidade cilíndrica, que representava a Terra. A leste do cadáver punha-se um cetro gui, também de jade, retangular e perfurado inferiormente; a oeste, um tigre de jade e ao norte (isto é, aos pés, uma vez que o norte chinês corresponde ao sul ocidental), um huang, semi-círculo de jade. Sobre a cabeça (isto é, ao sul chinês) havia um zhang, espécie de gui curto e truncado. Os sete orifícios do corpo eram selados com pedaços de jade e na boca colocava-se um pequeno objeto em forma de cigarra, também de jade, chamado "han". A cigarra, pelas metamorfoses que sofre em sua vida biológica, é, na China, um símbolo da ressurreição. Mais tarde na dinastia Han, verdadeiros trajes, formados de pequenas placas de jade costuradas com fio de ouro, vestiam os cadáveres nas tumbas. O costume foi consignado pelos "Anais da Dinastia ;Han" (Hanshi), mas, só em 1968 foram descobertos dois túmulos no Hebei, nos quais os corpos de seus ocupantes traziam costumes de quase 2.500 plaquetas de jade cosidas entre si.
No período dos Zhou posteriores, a arte refinada da fase dos "Estados Combatentes" (-480 a -222) transpôs- se para o jade. Criaram-se objetos em que "ao mais belo e intrincado refinamento de pormenores se uniu um ritmo dinâmico e uma ousadia de silhuetas" (Sullivan, 1965). O jade não tinha mais, nessa época, qualquer significação ritual. Era trabalhado para o prazer dos vivos: o Bi e o Cong tornaram-se ornamentos e o emprego do jade estendeu-se a toda uma série de objetos de luxo, tais como alfinetes de cabeça, pingentes, fivelas de cintos, agrafes, guarnições de espadas... O motivo decorativo mais comum era o chamado "tema granular" (grãos esculpidos e dispostos em espiral dentro de uma superfície limitada por motivos geométricos). Formas animais eram também empregadas sempre no ritmo ondulante do estilo de Ruai. Quando a peça de jade era maior, esculpia-se em vulto redondo. Um dos mais belos jades chineses está atualmente na William Rockhill Nelson Gallery of Art, em Kansas City, Estados Unidos. Representa um "Bi" com motivos de grânulos, encimado de duas formas animais (leões?). Um terceiro animal estende-se em torno do orifício central do "Bi". Dada a complexidade da decoração dos jades dos Zhou posteriores, acredita-se que os artesãos hajam utilizado, para talhar, um instrumento cuja ponta tivesse uma dureza comparável à da broca de diamantes moderna.


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