
A civilização chinesa se desenvolveu num grande espaço de terra, todavia cercado por diversas condições naturais que lha permitiram, durante muito tempo, um certo isolamento. As raízes da mesma estão assentadas em sociedades antigas, ditas pré-históricas, que lá tiveram seu berço. O estudo da China envolve, portanto, uma breve apresentação do seu habitat - vasto, diverso e bastante revelador sobre o caráter desta civilização.
Rios
As civilizações que compõe a China surgem próximas de rios, como no caso do Egito, Mesopotâmia e Índia. o processo parece ter sido similar; a busca de terras férteis, como inundações periódicas, ajudaram no estabelecimento das comunidades e no aproveitamento das terras. Três são os rios fundamentais da China: o rio Amarelo (Huang), ao norte, o Azul (Yang), no centro e o Rio das Pérolas (Zhuan) no sul - cuja embocadura é onde se localizam, atualmente, Macau e Hong Kong.
O rio Amarelo tem esse nome devido aos sedimentos que se depositam em seu curso, dando-lhe tal coloração. Na verdade, em grandes extensões de terra ao longo do rio tudo é amarelado, e o nome traz em si uma razão funcional. O Amarelo tem cheias violentas, muitas vezes geradores de calamidades públicas; no entanto, a terra por ele carregada (conhecida como Loess) é extremamente fértil, e fácil de ser manipulada. Em função disso, os chineses resolveram "harmonizar-se" (ou seria desafiar?) com a natureza, aprendendo a lidar com o rio por meio de barragens, canais, diques e contenções. Tirando proveito disso, adquiriram um grande conhecimento técnico sobre o assunto, conseguindo desde cedo irrigar vastas extensões de terra e estimular uma agricultura rica. O domínio do arroz, cultura que demanda grande quantidade de água, é um destes resultados marcantes para a sociedade chinesa.
Quanto ao Yang e ao Oeste, em grande parte navegáveis, foram domados aos poucos e utilizados nas mais diversas funções. O Yang é um dos maiores rios do mundo, servindo de via comercial ativa, e seu fluxo de água é pontualmente utilizado em usinas hidrelétricas. Desde cedo, contudo, estes cursos d'água estão ligados a função primordial da agricultura. Não raramente, calamidades épicas são provocadas por suas inundações, afetando uma parte substancial do país.
Climas
A China tem hoje a 3a maior extensão de terras do mundo, mas desde a época Han ela já conhecia as variações climáticas de seus espaços. O Norte chinês está perto da Sibéria, alcançando temperaturas baixíssimas, e encontra-se circundado a noroeste pelo deserto de Gobi. O centro da China constitui uma região de clima temperado, amenos, com a mudança bem marcada das estações. Em direção ao sul, penetra-se num clima equatorial, de chuva intensa e sempre quente, fazendo fronteira com o Vietnã.
Tais diferenças ocuparam a mente dos chineses, fazendo-os crer que viviam num lugar onde todos os climas do mundo existiam. No entanto, uma tal diversidade garantiu que o comércio inter-regional se desenvolvesse, e a curiosidade geográfica tornou o estudo dos mapas e rios uma atividade técnica altamente especializada. Os chineses confeccionaram alguns dos primeiros mapas do mundo, construindo um conhecimento detalhado sobre seu país.
Paisagens
As paisagens, delimitadas pelos climas, apresentam aos mesmos chineses um panorama vasto e curioso. O norte, feito de planícies secas, depende da água e das terras férteis do Amarelo. É uma terra de gente dura, de criadores, cujo caráter férreo (dizem) se molda pelo frio. Fato é que as planícies do norte pertencem, muitas vezes, aos nômades e pastores, "gente inculta" e bárbaros. As grandes invasões que a China sofreu, periodicamente, por conta destes povos, criou um ditado que diz que "Todo o perigo vem do Norte". Ironicamente, eles continuam a empregar o mesmo ditado com os EUA.
Quanto ao centro e ao Sul, há uma variação muito grande. As regiões centrais são cercadas pelos Himalaias, cadeia montanhosa que fechava (junto com os desertos do norte) o acesso por terra à China. No entanto, as regiões que acompanham o Yang, em direção ao mar, vão suavizando a paisagem, tornando-se imensas planícies férteis que concentram uma boa parte da produção agrícola. O sul, equatorial, fecha-se em densas florestas ou regiões plantadoras de arroz, marcados por um calor que não passa, e no entanto, permite colheitas abundantes. Cronistas portugueses diziam que em Macau, as paredes das casas ficavam repletas de limo, tal era a força das temperaturas altas, chuvas e vegetação abundante.
Delimitados pelo Pacífico, os chineses empreenderam uma rica atividade comercial e pesqueira por via marítima, mas pouco conhecida pelas autoridades imperiais. Juncos chineses operavam em todo o Mar da China, iam até o Japão, Filipinas, Vietnã, Indonésia e Índia. Tal atividade, porém, parece não ter oferecido contributos significativos para mentalidade chinesa sobre as possibilidades que os mares ofereciam. Confúcio já conhecia "a grande água", e os parcos conhecimentos náuticos da época lhes possibilitaram saber, no entanto, que encontravam-se num continente cercado de águas.
O Povo
A maioria do povo chinês é formada pela etnia Han, que compõe praticamente 90% da população. Mas existiu miscigenação na antiguidade, e o panorama das trocas culturais foi capaz de evitar uma homogeneização completa da civilização. Veja-se o caso dos Han, por exemplo, que moram no sul do país e pronunciam o chinês escrito de modo diferente do mandarim.
Os chineses se entendem aparentados com etnias próximas, tais como os mongóis e tibetanos, embora neste caso, a diversidade cultural estabeleça barreiras significativas. O inverso ocorreu com coreanos, japoneses e vietnamitas; próximos fisicamente, durante um bom tempo também adotaram a cultura chinesa como um saber de elite. O grande desafio dos chineses hoje é lidar, sem destruir, com as minorias étnicas que existem no espaço do país. Os uigur da Ásia central, por exemplo, nada tem a ver com a etnia han, mas estão dentro da China, e sentem-se estranhos diante de um governo central cujo idioma e cultura são absolutamente diferentes dos seus.
Fauna e Flora
A fauna chinesa envolve alguns animais exóticos, como o urso panda, habitante das florestas do sul, mas em sua grande parte é composta por tipos bem conhecidos no resto do mundo - desde o tigre, existente em todo o país, até a simples galinha e o porco. Na antiguidade, existiram também rinocerontes e elefantes a passear pela China, como atestam vasos de bronze do tempo Shang. No entanto, foram exterminados pela caça contínua, e em torno do século - 8 já não se ouve mais falar deles.
Quanto a flora, igualmente bem conhecida por nós, destaca-se porém a apreciação ímpar de vegetais cujo valor cultural ou material a põe em relevo, tal como a flor-de-lótus (usada com fins religiosos), o ginseng (raiz de uso medicinal), a amoreira, o pessegueiro (cujos frutos são nobilíssimos), a Lixia (fruta típica) e o bambu. Este último é o grande artífice desta civilização, sendo empregado na alimentação, na construção, medicina, etc. Sua ampla gama de aplicações e versatilidade, além da praticidade de plantio e cuidados, tornou-no um traço marcante desta cultura, a ponto de existir um gênero de pintura dedicado inteiramente à produção de imagens desta planta.
Alimentação
O arroz tornou-se o centro da alimentação chinesa, mas outros grãos - painço, cevada, trigo e soja- são plantados de acordo com a região. O sul da China consegue, há muito, obter mais de uma colheita anual de alguns grãos graças ao seu clima quente e abundância de água. Os chineses apreciam também uma grande quantidade de vegetais - repolhos, cebolas, rabanetes, couves, entre outros - que se misturaram a sua alimentação básica, composta pelo tradicional bolo de arroz, macarrão (de arroz ou trigo), papas de cereais e legumes e algum tipo de carne.
O uso da carne na China é baseado num critério de racionalidade herdado de priscas eras. Primeiramente, os chineses não tem o hábito de comer carne de vaca e usar o leite para beber ou fazer queijo. Além de ser considerado um hábito nômade, os chineses entendem que a fase de amamentação deve terminar no seio da mãe - e continuar tomando leite seria uma aberração. O gado bovino também ocupa muito espaço para alimentar-se, e seu consumo não é compensador - assim, o búfalo (principal bovino chinês) é criado mais para ajudar no trabalho do campo do que, propriamente, servir se alimento. Raras vezes ele é consumido, em geral em épocas de escassez ou necessidade.
As carnes mais consumidas são de porco e galinha - e durante muito tempo, de cão. Estes animais, pequenos, podem ser criados em pequenos espaços e se alimentam dos restos de comida humana, tornando-os inclusive um higienizador natural do lixo orgânico. A criação de peixes e camarões em tanques ou no meio dos arrozais é também uma tradição antiga, bastante apreciada. O tamanho da população chinesa fez, contudo, que a necessidade adaptasse o cardápio. Daí a razão pelo qual encontramos também petiscos exóticos tais como cobras, besouros, gafanhotos e escorpiões, servidos fritos em feiras ou em uma casa mais pobre. Uma opinião sobre tais alimentos só pode ser construída por meio de sua apreciação, posto que seus valores nutritivos e gosto já não são mais um problema científico, e sim cultural.
No mais, os chineses têm uma longa tradição de bebidas alcoólicas e de Chá. Originalmente, os chineses apreciavam diversos tipos de aguardentes e vinhos de cereais, principalmente de arroz. O Chá, trazido provavelmente da Índia, mas não se sabe exatamente quando, caiu no gosto chinês, tornando-se uma verdadeira arte. De vários tipos, aprecia-se principalmente o verde, que pode ser saboreado independente das refeições.
Os chineses desenvolveram o hábito, desde a antiguidade, de consumir vinho e água quente, o que diminuiu em muito a ocorrência de doenças provocadas pela sua contaminação. Ainda que não bem compreendida, a esterilização da água tornou-se uma prática comum desde tempos antigos, e continua difundida até hoje. A prática se consolidou com a difusão do chá, que é mais bebido, até hoje, do que sucos ou refrigerantes.
Novos hábitos vieram do exterior, por fim. Com os portugueses, aprenderam o uso do fumo, plantado no sul e altamente apreciado em todas as camadas da população. Recentemente, conheceram mais profundamente a arte do vinho e da cerveja ocidental, que buscam reproduzir.
Generalizações
Mas a presença das estruturas clássicas não torna a história do espaço chinês algo imóvel. Em primeiro lugar, a interferência no ambiente é algo antigo; Mêncio reclamava da devastação das florestas, e depois, no séc. -3, o Estado de Qin ligou dois rios, criando um canal e uma área inundada que revolucionou a economia local, aumentando a produção agrícola de um modo colossal na época.
Séculos depois, outras dinastias tentaram obras de fôlego, como ligar os rios principais (como o Yang e o Oeste), introduziram novos tipos de sementes (um tipo de arroz, descoberto durante o período Song, é capaz de dar até 3 colheitas ao ano), e investigaram todos os meandros do país em busca de recursos minerais e naturais.
Hoje, obras megalômanas como a represa das 3 Gargantas demonstram que a tradição de interferir no espaço de modo grandioso não cessou. Ela é a herdeira provável da grande muralha, cuja magnificência reside em sua extensão e antiguidade, mas que constitui hoje, porem, um monumento de inútil eficácia. O impacto da industrialização também fez soar o alarme ecológico, dado o aumento dos desequilíbrios ambientais no campo e nas cidades - Beijing sofre hoje, por exemplo, com uma poluição capaz de obscurecer o sol durante dias.
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