Sociedade

 

Como foi dito, houve uma preocupação muito forte, desde o início, com a questão da sobrevivência e da reprodução dos modelos efetivos de produção. Isso ocorria em virtude da grande população chinesa, que subsistia através da produção agrícola e da criação de animais, além da caça e da pesca. As primeiras culturas rurais foram as de arroz e painço, embora outros cereais fossem produzidos. Porcos eram também criados, além de galinhas, mas os chineses comiam basicamente qualquer espécie de carne. Os períodos de escassez eram constantes, e o terreno exigia um preparo cuidadoso, que envolvia por vezes irrigação e adubagem cíclicas. Por estes motivos, os soberanos desde cedo foram obrigados a elaborar calendários agrícolas como uma de suas funções sagradas. Um ano de desgraça ou de fome significava a perda de bênçãos por parte do Céu, levando a ruína de sua credibilidade. Obviamente, as classes mais altas da sociedade tinham recursos para consumir os mais variados produtos, e se quisessem, até importá-los; mas a maior parte da sociedade vivia mesmo no campo ou de trabalhos secundários e artesanais, presentes na cidade, e por conseguinte sua vida era um tanto quanto difícil neste aspecto. A sociedade chinesa era organizada em princípios feudais não muito rígidos desde a época Shang, mas durante a época Zhou este sistema atinge seu apogeu e se estrutura de forma semelhante a que seria encontrada posteriormente na Europa medieval. Economicamente, as relações produtivas estavam próximas de uma fusão entre este mesmo sistema feudal articulado ao modo de produção comunitário; no entanto, no aspecto social, havia uma mobilidade social bem maior, levando em conta que os fatores nobiliárquicos ou religiosos não impediam a ascensão social de um camponês, por exemplo. Isso dependia, basicamente, de suas posses e da educação que pudesse obter. Dominando ambos, ele poderia ser promovido, ganhando um título, e faria parte do grupo dos nobres que se divertiam com jogos, músicas e caçadas de grande porte. Esta vida concentrada no poder feudal estava vinculada à imagem do Imperador, homem sagrado que havia recebido um mandato do céu para harmonizar a vida social e por a civilização chinesa no andamento do ciclo cósmico. As atribuições de seu poder variavam, e embora ele fosse tido como sagrado, por vezes alguns imperadores foram derrubados por nobres que julgavam que ele havia perdido seu mandato celeste; assim sendo, o “filho do céu” tinha poder enquanto tivesse respeito, ou uma casa nobre bem forte amparando-o nos bastidores do poder. O próprio filósofo Mengzi já admitia que, “não mais atendendo o anseio dos povos, o imperador já perdeu o sentido de sua função”. Esse jogo de relações muda radicalmente com a dinastia Qin. A criação de uma burocracia forte e centralizada na figura da casa imperial, em detrimento dos poderes feudais, manifestava a preocupação dos novos governantes em limitar as forças de caráter local, bem como criar um mecanismo de ascensão social para as classes menos favorecidas através do trabalho estatal. Não é de se estranhar tal processo de reformas, já que o fundador da dinastia Han, Liu Bang, era provavelmente um camponês ou pequeno funcionário da corte. Mas aí encaramos uma questão: onde ele havia se educado? E como teria atingido este posto, tendo sido, talvez, apenas um humilde funcionário? De fato, a melhor educação dessa época era a paga, e as famílias que podiam contratavam um bom tutor para educar seus filhos nas mais diversas artes. Mas existiam também escolas abertas ao público, embora não saibamos ao certo seu funcionamento, elas parecem ter obtido um certo sucesso. O que inferimos, com clareza, é que depois do período Qin esses centros educacionais se preocuparam em preparar alunos para os concursos estatais que começaram a surgir, em função dos diversos cargos que a burocracia oferecia. Durante a época Han, com a eleição do confucionismo como doutrina oficial, essa prática atingirá seu grau máximo, e o valor da educação será manifestado pela criação de escolas públicas em todo país, bem como de centros de estudos de alto nível, algo correspondente às nossas universidades. De fato, os chineses sempre deram valor à educação, e na Antigüidade, apesar da escrita complexa, parece ter sido o povo que mais sabia ler e escrever. A escrita chinesa é um fator importante: ela não é alfabética, mas pictográfica, ou seja, composta de símbolos que possuem um código específico. Até Qin, existiam várias formas de escrita, mas unificação por ele empreendida uniformizou os pictogramas e ideogramas, permitindo que o chinês fosse mais facilmente compreendido. Tal foi o sucesso deste programa que ainda hoje lemos este mesmo conjunto de símbolos, sendo alguns modificados apenas pelos Chineses comunistas em período recente. A escrita também se transformou numa arte, e a caligrafia uma técnica de estilos variados e impactantes. Os chineses dominavam no campo artístico a música (uma escala de apenas 5 tons, tais como os elementos), a pintura, a escultura e a fundição. Esses avanços técnicos se refletiram igualmente na medicina, que ainda hoje evolui tendo por base os conhecimentos da Antigüidade. Formas antigas de exercícios físicos, aliados a técnicas clínicas e terapêuticas criaram um conjunto de práticas medicinais que com certeza foram as mais avançadas e eficientes do mundo antigo. É impossível agrupar de forma completa os aspectos diversos da vida cotidiana na antiga civilização chinesa. Vamos falar adiante do sismógrafo, da bússola, do papel e de outras criações, mas a clivagem que podemos realizar diante destes apontamentos é que a cultura chinesa criou um sistema abrangente de soluções para seus problemas materiais, evoluindo a partir disso para um modo de vida complexo e organizado, onde a funcionalidade do modelo estrutural era o fator organizativo fundamental na construção de sua sociedade. De qualquer forma, é interessante notar que tanto na vida urbana quanto na rural encontramos uma noção familiar forte, que se manifesta no agrupamento de várias gerações dentro de uma mesma casa. Não havia uma divisão sexual forte, pelo menos até o período de maturidade dos meninos (20 anos) e das meninas (15 anos), e em geral as famílias se dedicavam as mesmas atividades de trabalho. No espaço público, os chineses encontravam um momento de confraternização, através de peças de teatro, apresentações de música, jogos, do mercado ou nas casas de banho. Todos os assuntos são inicialmente tratados aí, até que se julgue conveniente trazê-los para dentro de casa ou não. Sujeito à lei e a ordem celeste determinada pelo Imperador, os chineses tendiam a conjugar sua ação e seu modo de vida não somente através deste cotidiano como também, como veremos agora, pelo calendário.

Textos

O povo ancestral

O Império do Meio

Visões dos Bárbaros

Unindo Yin e Yang

Notas sobre o Erotismo Chinês

A Educação vista por Confúcio

Comunitarismo Apolítico

A Escrita Chinesa

A Família Camponesa

A Vida dos Zhou [1]

A Vida dos Zhou [2]

A Vida dos Zhou [3]

A Vida dos Nobres Zhou [4]

A Era Han 

Economia na época Han

Na Cozinha de Confúcio

Texto de Apoio (01) - Liji - Sobre os Tempos Antigos

Texto de Apoio (02) - Liji - Sobre a Educação

 

Ligações externas

As concepções de Guerra e Paz na China Antiga

A Escravidão na China Antiga no Período Han

Ban Zhao e o Feminino na China Antiga

Uma história das Mulheres na China

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